
Tatuagem devolve autoestima para mulheres que passaram por mastectomia
Kacielle Coelho ansiosa para a primeira tatuagem
Kacielle Coelho aguarda ansiosa na sala com desenhos japoneses e quadros pendurados nas paredes no Morro das Pedras, no sul da Ilha de Santa Catarina. A jovem de 32 anos está prestes a fazer sua primeira tatuagem. Não será a flor de lótus que havia planejado, mas um círculo na mama direita. A aréola, que foi retirada com o tumor, em agosto do ano passado, será redesenhada nas mãos da tatuadora Janaina Piantino.
— Perder uma parte do corpo é sempre difícil, é uma amputação. Assim que fiz a cirurgia [de retirada de parte da mama], tirar o curativo foi meio traumatizante, a mama estava diminuída e sem aréola. Refazer essa parte do seio é um detalhe importante, porque fica natural novamente — afirma Kacielle.
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Kacielle descobriu o câncer de mama quando tinha apenas 30 anos – exatamente um ano e um mês depois da morte de sua mãe, causada pela mesma doença, após 12 anos de luta. Por conta do histórico familiar, desde os 24 anos a jovem ia ao ginecologista a cada seis meses para monitorar. Então, há dois anos o toque do médico detectou um pequeno tumor. Fez a cirurgia para retirada do câncer, procedimento para simetrização (para deixar os dois seios no mesmo tamanho), passou por quimioterapia e radioterapia. Foram oito meses de tratamento. Agora, mantém o acompanhamento de três em três meses.
Em julho, Kacielle refez a aréola com a tatuadora Janaina, de Florianópolis. Os traços a encheram de esperança de tirar o sutiã e se sentir bem novamente. Janaina trabalha há quase 20 anos como técnica de enfermagem e agora concilia as agulhas. A profissional tem 38 anos e é especializada em tatuagem paramédica, voltada especialmente para reconstrução estética de aréolas via pigmentação. Ela diz que passou a fazer o serviço em mulheres que passaram por mastectomia (retirada da mama) após enfrentarem um câncer há cerca de cinco anos, por indicação dos médicos com os quais trabalha.
Ela e o tatuador carioca Rodrigo Catuaba oferecerão o serviço voluntário na Expo Tatoo, que ocorre entre os dias 17 e 19 de agosto em Florianópolis. Durante o evento, haverá sessões gratuitas, mas é necessário agendar previamente (mais informações na página 6). Apesar de o resultado positivo na autoestima das mulheres e do procedimento ser seguro, a tatuadora diz que ainda há um pouco de medo, e muitas pacientes não querem mais passar por intervenções.
Mas pela abrangência da doença – só neste ano, devem ser 2 mil novos casos de câncer de mama em SC –, a tendência é que aumente a busca pelo serviço:
— Pelo número de mulheres com câncer de mama, a procura ainda é pequena. Mas o resultado é incrível. Fiz uma vez em uma senhora que logo depois se olhou no espelho e disse “agora sou eu de novo”. É a questão da autoestima e o fechamento de um ciclo para ela – conta a tatuadora, que já fez a pigmentação da aréola em cerca de 20 pacientes.
Janaina explica que não recomenda o procedimento para mulheres que ainda não colocaram a prótese ou não realizaram a reconstrução total da mama. Orienta que a tatuagem seja feita pelo menos quatro meses após a mastectomia e seis meses depois do tratamento. Por isso, é importante apresentar a liberação do médico:
— Tanto para a minha segurança, quanto da paciente, eu preciso de uma autorização médica. Até para o médico liberar, ver se ela já pode fazer a interferência, se tem algum uso de medicação, anemia. É um pouquinho diferente da tatuagem. Mais específico e mais delicado — afirma Janaina.
O mastologista do Cepon Carlos Gutavo Crippa explica que o SUS cobre a reconstrução do mamilo (bico do seio), mas não a dermopigmentação da aréola. Essa reconstrução do mamilo é feita no Cepon com enxerto de pele. Também é possível fazer a reconstrução da áreola com enxerto da própria área ou usar alguma outra parte do corpo para isso, como da virilha.
Crippa afirma que muitas pacientes acabam não fazendo o enxerto de aréolas e mamilos porque a cirurgia de reconstrução de mamas é complexa e exige diversas intervenções. Só depois poderá ser feita a remodelagem do mamilo, que seria mais um procedimento cirúrgico. Por isso, muitas vezes, a tatuagem acaba sendo a opção mais viável, sem contraindicações. Nestes casos, os profissionais do Cepon encaminham essas mulheres para voluntários que fazem o desenho.
– Muitas pacientes ficam pelo meio do caminho, por não querer mais fazer cirurgias, se dão por satisfeitas, digamos assim. Então, no final das contas, das pacientes que perdem a aréola e o mamilo, uma minoria acaba fazendo essa reconstrução – diz Crippa.

Mas o especialista considera fundamental essa finalização no processo de reconstrução mamária:
– Quando ela recupera essa parte do corpo, tem a sensação de que o tratamento dela chegou ao fim. E o mamilo, querendo ou não, é ele que traz identidade para a mama.
No caso de Kacielle, a tatuagem marcou o final de uma etapa de tratamentos e cirurgias. Agora, já planeja fazer outros desenhos na pele. Para essa nova fase, cogita a escrita “Tudo passa” no braço.
Onde encontrar tatuagem gratuita da aréola
• Expo Tatoo: Pode enviar mensagem na página do Facebook do evento (https://www.facebook.com/expotattoofloripa) ou direto para Janaina (48) 98452-4661
• Em Palhoça, projeto da Mirelli, enviar mensagem no Instagram @mirelliventura ou via WhatsApp pelo número (48) 99932-4749
• Projeto 19/10, de Theo Raych, enviar email para conect1910@gmail.com
5ª Expo Tatoo Floripa
• Acontece nos dias 17, 18 e 19 de agosto, no Centrosul, em Florianópolis. Os ingressos podem ser adquiridos na loja Civetta Tattoo Supply, e no local. O evento reúne tatuadores, apresentações culturais, exposições, show de bandas, desfiles de moda, food trucks, suspensão corporal e workshop.
Fonte: Diário Catarinense.